sexta-feira, dezembro 17, 2010

Por trás do espelho Capitulo 1 parte 1

CAPITULO 1  DISSOCIAÇÃO
Um homem corre desesperado, fugindo não sabe do quê, sente o pulso acelerado e o medo correndo por todo o seu corpo, precisa escapar, precisa sobreviver, a rua é comprida, muito mais do que parecia inicialmente, os prédios nela não tem janelas ou portas, são grandes caixas de concreto iguais, todos muito altos que não se enxerga o topo, todos com o mesmo número 9 marcado com algo que parece muito com tinta vermelha e brilhante, a rua estrá estranhamente vazia, enquanto corre a sua sombra fica sempre fixa as suas costas, os postes de luz passam velozes, ele ouve sussurros por toda a parte, mas é como se eles viessem da sua própria mente, vozes que são cruéis, que debocham, vozes que dizem que ele vai morrer, ele não sabe como chegou ali, não sabe onde está, nem sabe do que foge mas ele não pensa nestas coisas, ele não raciocina, só corre, foge, como um animal prestes a ser abatido, O homem finalmente alcança o fim da rua, há uma parede enorme, com um numero 9 gigante marcado a fogo, a parede toca o céu, não consegue ver maneira de passar, não há fendas, portas, janelas, buracos, não há saída o homem se desespera, sente que vai chorar, o medo só cresce mais em seu corpo, as vozes na sua mente só crescem, o mundo ao seu redor fica escuro e as vozes se tornam enormes como um coral maligno:
-Vai morrer! Vai! Vai! Há há há há há ha! Vamos cortar o teu corpo, vamos comer teu corpo, por que teu corpo é nosso, por que teu mundo é nosso, por que nós somos tudo! Tudo!
Treme compulsivamente, se deita no chão em posição fetal e chora como uma criança, como um recém nascido, as vozes agora são tudo o que ele conhece, ele sabe que vai morrer ali, sozinho cercado dessas vozes que o torturam, ele só quer que seja rápido, quer parar de sofrer, quer sumir daquele mundo, quer desistir, quer parar de ser ele mesmo, quer ser outra pessoa e sussurra pra si baixinho
-quem?
As vozes param, tudo para, o medo o choro, o desespero, tudo se foi, agora ele está calmo e lúcido, está em pé, com roupas quentes, confortáveis limpas, está puro, a rua estranha se foi, sem mais prédios bizarros agora está em um circo, um circo bonito, está um dia claro, várias crianças brincam, não consegue ver os seus rostos, mas consegue ouvir as risadas, consegue sentir a felicidade, sente o calor vivo do sol, e derrepente sente a vontade de visitar uma velha casa que conheceu um dia, mal pensa e uma casa se materializa, está ali, as mesmas janelas antigas o mesmo cheiro familiar, há um menino sentado há porta, não parece ter mais de cinco anos, ele brinca distraído com uma libélula que emana luz, o seu cabelo muito preto cobre o rosto, com uma pequena vara de madeira ele persegue o inseto brilhante, o menino ri muito observando o inseto se desviar dos golpes do pequeno bastão de madeira, quando finalmente atinge o inseto este para de brilhar, agora é só um inseto comum, e quando ele finalmente morre o menino volta o rosto para o homem, a boca se contorce, o menino grita alto, um desespero quase insuportável, mas não há lagrimas, o menino não tem olhos, o dia fica escuro, o circo e as crianças desaparecem, tudo o que resta é a casa, as vozes começam a reaparecer, com elas o medo, o menino agora grita com uma voz grave, que não parece ser dele, a mesma palavra repetidamente:
-QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM?QUEM? QUEM? QUEM?
O homem corre para dentro da casa, precisa buscar abrigo, precisa se proteger, passa por vários comodos iguais,várias salas de estar, todas com a mesma mobilia, todas iguais, até que para de súbito, não há como aquilo ser real, a casa, não existe casa assim, com múltiplas salas exatamente iguais, com os mesmos móveis antigos, a mesma vitrola, a mesma tevê, a sala não é real, a casa não é real, então nada ali é, nem o medo, nem as vozes, nada, ele está sonhando, o homem fecha os olhos e repete pra si:
-É só um sonho, acorda! Acorda!
O homem abre os olhos, está deitado na sua cama, dentro do seu quarto, fica aliviado em perceber que era tudo um sonho, se levanta e caminha até o banheiro, se olha o espelho, o reflexo olha de volta cansado, o homem tenta abrir a torneira, quer lavar o rosto mas a torneira está emperrada.
-Todo o dia é isso! Essa merda de torneira sempre!
O homem tenta abrir a torneira a força, ele projeta o corpo sobre a pia, as gotas de suor se formam no seu rosto, a torneira cede mas o homem se desequilibra, cai e derruba o espelho que se quebra com um barulho estridente, o homem corta a mão direita tentando se levantar.
-Merda! Que merda!
O homem se levanta, quer primeiro lavar o ferimento na pia, mas não há pia.
Ele olha para a mão ferida, não há ferimento
No chão não há sangue, nem há os cacos do espelho destruído
Ele olha de volta pra onde o espelho estava antes de tudo, ele está lá, no mesmo lugar, intacto
Ele fica aturdido, desorientado, há algo errado, o banheiro começa a tremer, o teto desaba mas os escombros não atingem o homem, eles simplesmente desaparecem, a estrutura toda cede, enquanto o homem observa tudo paralisado, só o que resta é o espelho, suspenso no ar. O homem escuta de súbito uma voz distante, é diferente das outras, uma voz que não amedronta, que não o oprime, que de alguma maneira desconhecida o conforta, a voz não vem da sua cabeça, mas sim do espelho.
O homem se aproxima
O reflexo se forma no espelho
O homem olha nos olhos da sua imagem
O reflexo sorria
O homem não
O reflexo abre a boca leve mente e sussurra
-quem?
O homem não responde
O reflexo repete a pergunta, em um tom mais agressivo
-Quem?
O homem fica confuso
-Eu não entendo...
O reflexo se irrita mais
-QUEM?!
O homem não sabe o que dizer
O reflexo começa a gritar, a cada palavra a sua ira aumenta
-QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM? QUEM?QUEM? QUEM? QUEM?
O homem não consegue pensar, não sabe o que aquela imagem quer, não sabe o por que de tanto ódio, aquele não é ele, não pode ser ele tem que ser outra pessoa, precisa ser outra pessoa, por que ele não pode ser assim ele não quer ser assim, tão furioso, tão irado, quem é aquele que grita no espelho, quem era o menino? que rua era aquela quem eram as vozes que traziam o medo?, quem era aquele homem que pensava em todas essas questões? Qual era o seu nome? quem era ele? quem?
-Quem sou eu?
A imagem para de gritar, o homem levanta os olhos e fita os do reflexo, o reflexo rí debochado e fala com a mesma voz que era do homem.
-Exatamente

2 comentários:

  1. Como sempre, excelente. Não poderia esperar menos do que isso vindo de você, guri.
    O "conto" conseguiu me prender desde o início e deixa o leitor ávido para saber o desenrolar da história. Estou curiosa para saber qual o real significado desses sonhos, mas sei que você vai me deixar aqui, na curiosidade.
    Me sinto honrada por você ter postando parte de seu livro apenas para que eu lesse. Muito obrigada mesmo.
    Beijinhos e uma ótima noite :*

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  2. Não lembro se já avisei que tem mais selos no blog pra vs... SOAISOAISO

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