Seu corpo agora pesava, respirava com muito esforço, podia ouvir o próprio coração bater rápido, como se o músculo estivesse desesperado para salvá-lo, como se pressentisse que logo ia parar de vez, cada batida a mais era agora uma batida a menos, como um relógio em contagem regressiva para o nada, o tempo, ou a falta deste, que nunca antes fora um problema, agora se tornava uma tragédia real, ele queria mais tempo, agora sabia, agora queria viver.
Era ele e o outro, parados em meio à avenida, cercados de carros abandonados, com pessoas, milhares de pessoas, atentas a tudo, algumas oravam em silêncio, algumas gritavam palavras que eram agora, na ultima das horas, apenas sons incompreensíveis e algumas outras choravam, pareciam realmente tristes, seria por ele?
O outro agora levanta a pistola, num movimento lento e constante, como se fosse para lhe dar mais tempo vivo, ou só para prolongar a dor, não se sabe.
Eleva o braço da arma à altura do ombro e ali para, na posição de tiro.
Plínio põe a mão sobre o peito, sobre o ferimento, sobre o lugar do tiro que recebera, três dedos acima do coração.
-Não vou errar o próximo tiro, Plínio.
A voz parecia vir de longe, com os olhos cansados e a visão borrada, Plínio só conseguia enxergar um borrão do homem que seria seu carrasco, a voz era fria, clara e definitiva, mas inexplicavelmente isso o fez sorrir
- Por que em uma hora como essa você sorri? onde está a graça nisso tudo?
Plínio tira a mão da ferida, a mão está coberta de sangue, mas ele não sente mais dor, não sente mais seu corpo, ele olha para o outro, consegue focar nos seus olhos, que estão agora estranhamente surpresos, e fala, quase rindo:
-Você parou de me chamar de garoto.
Tiro
Gritos
Silêncio